sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Monumentos à morte ou um alerta à vida?

Quando fui à Itália pela primeira vez em 2006, uma coisa me chamou a atenção de forma especial: "a presença da morte". Não porque vi gente morrendo, não porque presenciei hospitais lotados como no Brasil. Nada que se assemelhe a isso. Mas ela estava lá magestosamente lembrada. A morte da qual a nação não se envergonhava, mas enaltecia.

Um dia, passeando no centro cidade de Savona, uma bela cidade litorânea na Ligúria, passamos, meus amigos e eu, por uma praça bem típica circundada por prédios antigos, e vi em seu centro um monumento onde uma pira estava acessa. Procurei saber o significado de tal monumento e tomei conhecimento de que se tratava de um memorial aos mortos em guerras pela "gloriosa" Itália.




Joziel e Eu em frente ao memorial aos mortos de guerra
O tempo passou e quando o relógio marcou 18h soou o toque de um sino e todos pararam, carros, ônibus, pessoas... Todos ficam estáticos e os guardadas se mantiveram atentos para que o ritual fosse cumprido. Lembrei-me de meu tempo de criança em que brincávamos de "estátua". Após combinarmos a brincadeira, alguém gritava: "Estátua!", e todos parávamos na posição em que estávamos. Normalmente nos divertiamos muito com as posições engraçasdas que surgiam. Quanto mais estranhas eram as estátuas, quem estava no comando da brincadeira costumava demorar mais ainda para liberar a todos de suas posições.

Mas na Itália, naquele momento, não estávamos nos divertindo. Ficamos como estátuas como se fosse uma forma de voltar ou parar o tempo para lembrar daqueles que deram suas vidas em guerras. Guerras justas contra as ameaças à nação ou guerras injustificadas por causa de concepções errôneas ou de prepotência de líderes treslocados... Em meus sentimentos brotou um misto de reverência ao ato em si e de admiração por um povo que sabe preservar suas memórias. Ao mesmo tempo refleti que, como brasileira, nos meus sentimentos não havia a "sombra da morte". Não pesava sobre o ar brasileiro a morte ou a celebraação da morte, apesar dos milhares mortos pelas balas perdidas, pelo trânsito brutal, pela insensibilidade dos políticos em relação a efetivação das políticas públicas de saúde...


Ao passear pelo calçadão da praia de Albissola, distrito de Savona, contemplando as águas do Mediterrâneo, novamente um monumento me chamou a atenção. A imagem, sob um olhar não tão atento, me sugeria um monte de caveiras, corpos esquartejados. A princípio pensei tratar-se de mais uma escultura de algum artista desses que gostam de pintar e esculpir caveiras. Mas ao analisar mais de perto, comecei a entender que se tratava também de mais um monumento aos mortos de guerra.


Talvez aquilo que chamo de "celebração da morte", na verdade, seja um meio de fazer lembrar e de alertar quão brutal o ser humano pode ser uma vez distituído de sua capacidade de amar, de sua condição de ver o outro como um ser semelhante a si próprio, e não como um mero instrumento de realização do seus instintos, de sua sede de poder.

O Senhor Jesus nos diz de forma categórica: "Ama ao teu próximo como a ti mesmo". É uma lei divina. Ah! Se fôssemos capazes de entender o significado de tal ordenança... Tantos que se dizem cristãos e vão buscar em filosofias, em seitas orientais, dentre outras, os significados que Jesus ensinou quando de sua vinda ao mundo.

Gandhi falou de vencer os inimigos com pacificação, mas Jesus já havia dito: "Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra. Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus. Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus" (Mt 5.5,9-10).

O Budismo ensina que é preciso superar ou suportar o sofrimento até que se possa chegar ao estado total de paz, o nirvana, por meio da disciplina mental na vida cotidiana, o que implica em não viver ansioso. Mas Jesus, para além de nos ensinar a não viver ansiosos, nos fala de sua provisão e cuidado conosco, nos dá a conhecer a razão de nossa esperança:

Observai as aves do céu: não semeiam, não colhem, nem ajuntam em celeiros; contudo, vosso Pai celeste as sustenta. Porventura, não valeis vós muito mais do que as aves?
Qual de vós, por ansioso que esteja, pode acrescentar um côvado ao curso da sua vida?
E por que andais ansiosos quanto ao vestuário? Considerai como crescem os lírios do campo: eles não trabalham, nem fiam.
Eu, contudo, vos afirmo que nem Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer deles.
Ora, se Deus veste assim a erva do campo, que hoje existe e amanhã é lançada no forno, quanto mais a vós outros, homens de pequena fé?
(Mt 6.26-30).

Jesus não nos fala de uma simples conformação com o sofrimento, mas nos leva a suportar com esperança o dia mau, porque logo, logo o momento de cantar vai chegar porque Ele cuida de nós mais do que cuida das aves do céu! Jó expressou muito bem essa verdade: "Porque eu sei que o meu Redentor vive e por fim se levantará sobre a terra" (Jó 19.25.

Dois anos e meio depois pude voltar à Itália com meu esposo e rever os lugares onde estive antes. Novamente, às 18h, estávamos como estátuas na praça. O sino havia soado e um desavisado não parou e ouvimos o som agudi do apito do guarda lhe dando o comando de parar. Por mais que não quisesse ou não soubesse, ele teve que parar.

Quem sabe há um apito do céu soando para você dizendo: você precisa parar para refletir enquanto há tempo de mudar de atitude na vida; mudar a forma de ver o outro e tratá-lo com o mesmo amor que você sente por si mesmo; mudar a forma e o lugar de buscar conhecimento, deixar o falso e  o buscar a verdade em Cristo.
Do monumento à morte podemos aprender lições de vida!